4 de Agosto de 1995
Localização: Ganvie “Veneza da África”,
localizada em Benin (África Ocidental)
As luzes dos postes anunciavam o crepúsculo que estava por surgir. Era o sinal exato para que os homens saíssem de suas casas para prover comida a suas famílias. Um grupo de pescadores locais experientes se reunia todas as noites perto do cais do grande
Lago Nokoué, onde sempre se preparavam rapidamente com seus remos e redes para mais uma rotineira pesca na parte mais selvagem de
Nokoué.
O cheiro de água doce misturado com as algas do lago agradava o olfato de todo o grupo, que passava silenciosamente entre as árvores cujos troncos submersos no lago se destacavam. O único som que acompanhava o grupo era o canto dos pássaros e o farfalhar dos remos cortando a superfície lisa do lago.
Não demoraria muito para o grupo chegar ao local habitual de pesca, uma região afastada e isolada, onde lançavam suas redes. Outros animais também frequentavam constantemente essa área, atraídos pela abundância de peixes ou simplesmente para saciar sua sede.
Porém, um cheiro pútrido pairava no ar. Ao se aproximarem, os pescadores avistaram o cadáver de um hipopótamo, sendo devorado por um grupo de macacos. Era uma cena jamais vista ou sequer imaginada. Ao perceberem a presença dos humanos, os macacos, tomados por um surto de raiva, pularam e atacaram o grupo com mordidas e arranhões.
Em uma tentativa desesperada de se defender, os pescadores jogaram toda a sua pesca na direção dos macacos, que rapidamente interromperam o ataque para devorar as dezenas de peixes capturados.
Assustados e desesperados, os pescadores retornaram à vila sem os mantimentos que garantiriam mais um dia sem fome a suas famílias.
Entretanto, o grupo não sofreria apenas com o ataque inesperado dos macacos raivosos. Com o passar do tempo, sintomas como vômitos, febre, calafrios e feridas começaram a surgir, tornando-se cada vez mais frequentes e severos, enquanto os pescadores definhavam lentamente.
O corpo humano tentou, sem sucesso, combater o que quer que tivesse contaminado o grupo após os ataques dos macacos. Mas nada adiantou, e todos os pescadores afetados começaram a desenvolver comportamentos e características semelhantes às dos macacos.
Ganvie era uma cidade turística visitada por pessoas de todas as partes do mundo. Antes mesmo do conhecimento da nova doença que surgiria a partir dos macacos que atacaram os pescadores, esse fato contribuiu para a rápida proliferação do que mais tarde seria conhecido como
"Venézis".
A fauna e flora exuberantes e prósperas, aliadas à convivência harmônica entre seres humanos e animais, além da arquitetura exótica de
Ganvie, tornavam a cidade um local de interesse para turistas de diversas partes do mundo. Entretanto, essa mesma atração foi a principal causa da epidemia que ocorreria mais tarde.
Não se sabe exatamente a origem do vírus, além de que seus primeiros hospedeiros foram os macacos. A doença, antes de se espalhar para os humanos, havia causado um desequilíbrio no ecossistema local, transformando os macacos em predadores. Com o aumento do número de predadores e a escassez de presas, os macacos infectados se aproximaram dos humanos, resultando no primeiro e devastador contato com a Venézis.
A doença evoluía rapidamente no corpo humano, afetando todo o sistema nervoso e provocando uma raiva animalesca, porém com inteligência comparável à dos primatas, o que tornava o controle dos infectados extremamente difícil.
Quando a doença se espalhou pelo mundo, questões éticas começaram a surgir. Alguns consideravam os infectados mortos-vivos, enquanto outros acreditavam que ainda estavam vivos. No entanto, nenhuma solução concreta foi encontrada, além de preparar a humanidade para um cenário de apocalipse, semelhante a um apocalipse zumbi.
Os continentes mais afetados inicialmente foram aqueles com maior poder econômico, cujos cidadãos haviam viajado para Ganvie ou tido contato com viajantes de lá. Europa, América do Norte, Oceania, parte da Ásia e, claro, a África foram os primeiros a sucumbir.
O caos generalizado causado pela Venézis transformou a
África, com exceção de
Marrocos e
África do Sul, em uma terra sem lei, sem governo e sem proteção. O mundo isolou o continente, aguardando o desenvolvimento de uma cura. Entretanto, os habitantes africanos, em um movimento desesperado de sobrevivência, provocaram uma diáspora sem precedentes para todas as partes do planeta, iniciando assim uma pandemia mundial de Venézis.
Os países afetados, com governos estáveis, conseguiram instaurar quarentenas e controlar a Venézis, enquanto países instáveis foram destruídos por seus próprios problemas internos, sejam guerras civis, economia frágil ou má localização geográfica.
Com o tempo, até mesmo as nações mais fortes começaram a ruir, restando apenas alguns países ou ilhas que conseguiram sobreviver, como
Islândia,
Groenlândia,
Hokkaido (Japão),
Nova Zelândia,
Cuba e
Malta.
A anarquia agora governava o mundo. Uma ruptura irreversível ocorreu em todo o ecossistema terrestre. Grupos surgiram com diferentes ideais e propósitos, espalhados por todo o planeta. O mundo não estava mais à beira do caos, ele já estava mergulhado nele, e aos vivos restava apenas uma coisa:
sobreviver em suas vidas pobres e miseráveis.